
Artigo originalmente publicado em 19 de julho de 2009
Nós, que estamos acostumados a lidar com as tragédias alheias, sábado ado (11/7/2009), fomos surpreendidos por uma à nossa porta. Um queridíssimo funcionário do jornal, Carlos Henrique, chamado por todos carinhosamente de Kaká, sofreu um acidente de trânsito e nos deixou. Ao choro e sofrimento dos colegas de trabalho, amigos e familiares, somaram-se demonstrações de forte simbolismo, que permaneceram na minha lembrança por toda a semana — e na de muitos outros, certamente. De forma impressionante, Kaká reuniu em torno de si o que há de melhor no mundo: os sentimentos de amizade, solidariedade, a presença de Deus e da força do ser humano. Não é possível esquecer o imenso cortejo de jovens e amigos que o seguiu até a sepultura. Menos ainda a imagem da mãe, Liliana, segurando o caixão do filho e entoando um cântico religioso, com a voz forte e segura de quem sabe que a presença daquele menino não se esvai pura e simplesmente com seu corpo.
Liliana demonstrou diante de todos que sua imensa dor não é maior que a certeza de que existe uma razão, ainda que não a conheçamos, para que Kaká tenha ido tão cedo, com apenas 22 anos. Existem muitas formas de uma mãe demonstrar o amor por um filho, assim como existem também várias formas de viver a dilacerante dor pela perda dele. A mãe que vi naquele velório — abraçando e também consolando cada um daqueles jovens presentes, despedindo-se em voz alta do filho e falando do privilégio de ter vivido a seu lado — certamente escolheu o melhor jeito de viver a vida e encarar a morte: sem revolta, com confiança em Deus para seguir adiante e ar a saudade, esta sim vai acompanhá-la para sempre. A canção de Liliana lembrou-me de tantas outras mães unidas na mesma dor, que perdem os filhos nas esquinas e no asfalto das grandes cidades, nos campos de batalha, nos leitos de hospitais. São mulheres guerreiras, das quais o mundo não pode prescindir. É a força delas que consola todos a seu redor.
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Emocionada, assisti à despedida de Kaká e ao luto que se seguiu à agem dele. Aqui na redação e, principalmente, na fotografia, onde ele trabalhava, vi demonstrações até incompatíveis com a presença discreta daquele menino calado, funcionário exemplar, carinhoso com todos à sua volta. O choro incontido de alguns ao encontrar o lugar dele vazio, um pano preto sinalizando a dor da saudade, o silêncio profundo em alguns momentos, aos poucos substituído pelos risos ao lembrar as histórias vividas em conjunto. Na última sexta-feira, sete dias depois da morte de Kaká, a homenagem tornou-se perene: quem entra na fotografia hoje se depara com uma sala agora batizada, com seu nome impresso. Uma bonita lembrança dele, que dedicamos carinhosamente a Liliana e sua família, porque a força deles nos inspira a seguir em frente com alegria, assim como era o Kaká, sereno e feliz.