
Dois líderes do grupo criminoso salvadorenho Barrio 18 descreveram ao jornal digital El Faro os detalhes de uma suposta negociação que teria ajudado o presidente Nayib Bukele a chegar ao poder, segundo entrevistas publicadas nesta sexta-feira.
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Uma investigação do jornal revelou em 2020 um suposto acordo entre Bukele e os grupos criminosos para reduzir os homicídios, em troca de dinheiro e privilégios para seus líderes presos, o que o presidente negou.
Carlos Cartagena, conhecido como "Charli", líder de uma célula da facção Revolucionários do Barrio 18, contou ao jornal que os grupos negociaram - por meio de dois colaboradores de Bukele sancionados por Washington - apoio para que ele se tornasse prefeito de San Salvador de 2015 a 2018 e chegasse à Presidência em 2019.
"Cerca de 75%, 80% se deveu às gangues", disse Cartagena, ao ser consultado sobre a vitória de Bukele pelos irmãos jornalistas Óscar e Carlos Martínez, que fizeram as entrevistas em janeiro, em local não revelado.
Sem citar o jornal, Bukele, popular por sua guerra contra os grupos criminosos, afirmou hoje no X que "um país em paz, sem mortos (...) não é rentável para as ONGs de defesa dos direitos humanos nem para veículos globalistas", que, segundo ele, perderam "seu negócio".
Um segundo líder entrevistado, de posto menor que o de Cartagena na facção Barrio 18 e identificado como Liro Man, contou que membros de gangues ameaçaram famílias nos bairros que controlavam para que votassem em Bukele.
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Segundo os dois líderes, os contatos com os grupos foram feitos por Carlos Marroquín, diretor do programa do governo Tejido Social, e Osiris Luna, vice-ministro da Justiça e diretor-geral de prisões. Os dois foram sancionados em 2021 pelo governo dos Estados Unidos, que os acusou de negociar com líderes dos grupos Mara Salvatrucha (MS-13) e Barrio 18.
Segundo Cartagena, as gangues ajudaram o governo a manter a população confinada durante a pandemia de Covid-19. Ele contou que Bukele lhes prometeu "o fim da guerra" entre as forças de segurança e os grupos criminosos, mas que, depois que ele chegou ao poder, o suposto acordo foi rompido.
Após um fim de semana com 87 mortos, Bukele impôs em 2022 o regime de exceção, durante o qual foram presos mais de 80 mil supostos membros de gangues e colaboradores sem mandado judicial, o que gerou críticas de grupos de defesa dos direitos humanos.
O presidente itiu que cerca de 8 mil detidos inocentes foram libertados.