
A primeira-ministra da República Democrática do Congo (RDC), Judith Suminwa Tuluka, afirmou, na última segunda-feira (24/2), que o conflito que ocorre no leste do país, provocado pelo grupo antigovernamental congolês Movimento 23 de Março (M23), matou mais de 7 mil pessoas desde janeiro. O pronunciamento ocorreu em reunião do Conselho de Direitos Humanos da Organização das Nações Unidas (ONU) em Genebra.
“A situação de segurança no leste da RDC atingiu níveis alarmantes”, afirmou Tuluka, de acordo com a agência de notícias -Presse. Segundo ela, os mais de 7 mil “compatriotas” que morreram desde o início do conflito ainda não foram todos identificados, mas haveria, entre eles, “proporção significativa de civis”.
O grupo rebelde M23, que o governo da RD Congo afirma ser apoiado por Ruanda, tomou o controle de duas localidades importantes do leste da RDC: primeiro Goma, principal cidade do leste do país e capital da província de Kivu do Norte, no fim de janeiro; e depois Bukavu, capital de Kivu do Sul, em 16 de fevereiro.
Até o último levante oficial da ONU — que ocorreu antes da tomada de Bukavu — haviam sido reportadas pelo menos 2,9 mil mortes e mais de 500 mil deslocamentos desde o início do ano.
Embora o organismo internacional esperasse uma migração máxima de 58 mil congoleses em direção ao Burundi em três meses, quase 42 mil pessoas fugiram em apenas duas semanas para o país vizinho a RDC e Ruanda, a fim de escapar da violência que assola o leste congolês. O alto comissariado para refugiados da ONU, Acnur, informou que se trata maior fluxo de refugiados da RD Congo em direção ao território burundiano em 25 anos.
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Em nota publicada no site oficial da agência em 18 de fevereiro, o porta-voz Matthew Saltmarsh afirmou que essas pessoas — cerca de 80 por dia vindas de Kivu do Sul — chegam a Burundi “exaustas e traumatizadas, muitas delas separadas de seus familiares e sem informações sobre seu paradeiro”.
Segundo o Acnur, o número de refugiados em direção a território burundiano deve aumentar à medida que o M23 se aproxima da cidade congolesa de Uvira, próxima à fronteira oficial entre os dois países. Outros 15 mil congoleses fugiram para outros países vizinhos desde janeiro — 13 mil para Uganda.
De maioria tutsi, o M23 diz que deseja “libertar toda” a RD Congo, a fim de proteger a etnia, e “expulsar” o presidente congolês, Felix Tshisekedi. Ruanda nega que tenha tropas mobilizadas no país vizinho em apoio ao grupo armado, embora autoridades congolesas denunciem a presença de mais de 4 mil soldados ruandeses no leste da RDC.
Embora a RD Congo acuse Ruanda de querer controlar uma área rica em ouro e minerais indispensáveis para o setor tecnológico, a nação comandada por Paul Kagame diz garantir a própria segurança ao ter como objetivo erradicar grupos armados na região — em especial as Forças Democráticas para a Libertação de Ruanda (FDLR), formadas por hutus responsáveis pelo genocídio tutsi em 1994 e supostamente apoiadas pelo governo de Tshisekedi.
Entenda o conflito no leste da RD Congo
A fronteira entre República Democrática do Congo e Ruanda sofre com conflitos e violências históricas, que culminaram em um genocídio da etnia tutsi em Ruanda, em 1994. Desde então, rivalidades regionais, disputas étnicas e combates entre grupos armados foram agravados nos territórios próximos à divisa e ocorrem por mais de 30 anos.
Desde que ressurgiu, em 2021, o grupo antigovernamental de maioria tutsi M23, da RD Congo, vive em confronto com o exército do próprio país e tomou diversos territórios congoleses. No fim de janeiro deste ano, o conflito se intensificou e contou, de acordo com autoridades congolesas, com a entrada de mais de 3 mil soldados de Ruanda.
Oficialmente, o grupo rebelde — que já havia tomado Goma no fim de 2012, antes de ser derrotado por forças congolesas e pela ONU em 2013 — rejeita o apoio de Ruanda e se apresenta como um movimento nacional com o objetivo de derrubar o governo do atual presidente da RDC.
O governo ruandês também nega controle sobre o M23 e qualquer envolvimento militar no conflito. A missão da ONU na RD Congo — a ‘Monusco’ —, porém, alerta para o risco de os combates reacenderem conflitos étnicos que remontam à época do genocídio, em que 800 mil pessoas foram mortas.
Em julho do ano ado, RDC e Ruanda haviam assinado um acordo de cessar-fogo. O tratado de paz definitivo, que seria assinado em dezembro, porém, nunca saiu do papel, pois o presidente ruandês se recusou a participar de cúpula organizada por Angola para selar o fim dos conflitos que reascenderam há cerca de quatro anos.
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