Sensação de pés gelados e de peso nas pernas podem ser sinais de varizes, mesmo que, aparentemente, não haja nada de errado com as veias. A conclusão é de um estudo publicado na revista Open Heart, com dados de 8.782 pessoas entre 30 e 70 anos. Todas haviam sido diagnosticadas com a anomalia, grave ou moderada, e foram questionadas sobre a hipersensibilidade térmica e o cansaço nos membros inferiores.
Segundo os pesquisadores da Universidade Médica Chung Shan, em Taiwan, estudos anteriores sugeriram que o frio excessivo nos pés tem associação com varizes latentes, aquelas que ainda não são visíveis. Eles alertam, porém, que o sintoma costuma ser subestimado. Para os autores, é importante considerar essa queixa para garantir possíveis intervenções precoces, antes que as veias dilatadas e tortuosas se tornem um problema.
As varizes são geralmente causadas pelo comprometimento do funcionamento das veias profundas ou superficiais e das perfurantes (veias curtas que conectam os sistemas venosos superficial e profundo nas pernas). A prevalência varia de 2% a 30% em adultos, sendo que as mulheres são mais afetadas. "As mulheres são mais suscetíveis devido aos hormônios femininos, que podem provocar lesões na parede dos vasos", explica a cirurgiã vascular e angiologista Tatiana Losada, de Brasília. A médica esclarece que os principais sintomas são queimação, inchaço, sensação de peso e cansaço nas pernas. "Veias muito dilatadas, dor que não melhora, mesmo com repouso e escurecimento da pele, são sinais de alerta", diz.
Trabalho
O estudo publicado na Open Heart usou dados do Taiwan Biobank, o maior banco de dados genético e populacional da nação insular asiática. As informações foram coletadas entre janeiro de 2008 e dezembro de 2020. Os pesquisadores se concentraram em questões potencialmente influentes para o surgimento de varizes, como sexo, dieta, idade, tabagismo, consumo de álcool, exercícios regulares, peso, escolaridade, tipo de trabalho (predominantemente em pé ou sedentário) e presença de diabetes 2 e pressão alta.
No total, 676 participantes afirmaram ter varizes moderadas a graves. Outros 5.888 disseram não sentir os pés gelados e, desses, menos de 6% tinham o problema. Já 1.535 confessaram ser moderadamente sensíveis aos frio. Desses, 9% foram identificados com a condição. Dos 1.359 que revelaram a hipersensibilidade térmica, 14% tiveram o diagnóstico confirmado.
A análise estatística mostrou que a hipersensibilidade moderada a grave ao frio foi associada a uma probabilidade de 49% a 89% maior de varizes, em comparação com a ausência dessa sensação. Além disso, quatro vezes mais pessoas com a condição sentiam as pernas pesadas. O tipo de trabalho também foi um fator influente: ficar em pé por muito tempo foi associado a um risco 45% maior do problema.
"A hipersensibilidade ao frio é diferente da sensação de frio, apenas", esclarece o cirurgião vascular Eduardo Toledo de Aguiar, professor da Faculdade de Medicina da Universidade de São Paulo (FMUSP) e diretor médico da Spaço Vascular. "São sensações e sinais — formigamentos e coloração arroxeada ou palidez das extremidades — estimulados pela diminuição de temperatura", conta. "Ocorre não somente nos pés, também nas mãos. Segundo o artigo, quem tem sensibilidade ao frio apresenta risco maior de ter varizes, o que pode sugerir que o doente mereça uma avaliação médica especializada", observa.
Cansaço
O estudo também mostrou que, na ausência de hipersensibilidade ao frio, a probabilidade de varizes foi sete vezes maior em pessoas que tinham sensação de peso nas pernas. Entre os participantes com esse sintoma, o risco da condição venosa foi de 90% entre aqueles com percepção moderada de resfriamento nas extremidades, e mais de três vezes maior, considerando os que autorrelataram frio intenso.
O angiologista e cirurgião vascular Bruno Carvalho, da clínica Angiprime, em Brasília, ressalta que o estudo é observacional, ou seja, não apresenta uma relação de causa e efeito. Além disso, ele lembra que não há comprovação científica da associação estatística encontrada pelos pesquisadores. "A hipótese do estudo é que a dilatação das veias gera um reflexo de vasoconstrição, levando a uma diminuição da circulação na perna e, por consequência, a essa sensação de frio. Mas não há comprovação científica absoluta a respeito desse fato", pondera.
Os autores reconhecem a limitação apontada por Carvalho, mas defendem que os médicos considerem a queixa dos pacientes na avaliação clínica. "Quando os sintomas de hipersensibilidade ao frio e peso nas pernas coexistem, a probabilidade de confirmar a presença de varizes é consideravelmente maior, em comparação com indivíduos sem tais sintomas", escreveram, em nota.
Eduardo Toledo de Aguiar, da FMUSP, destaca que varizes não acompanhadas podem evoluir para casos clínicos mais graves (veja quadro nesta página), com aumento do risco de trombose. "Se reconhecermos esses sinais, podemos intervir mais cedo e melhorar o prognóstico, evitando a progressão da doença", concorda Gustavo Solano, cirurgião vascular e endovascular, e membro da Sociedade Brasileira de Angiologia e Cirurgia Vascular (Sbacv).