Economia

Dez anos depois da crise imobiliária nos EUA, Brasil ainda sofre os efeitos

Políticas de concessão de crédito e subsídios usados a partir da quebra do banco Lehman Brothers, em 2008, elevou o endividamento de famílias e empresas de 37,59% do PIB para 46,41% e deu início à crise fiscal que dura até hoje no país

Hamilton Ferrari
postado em 11/09/2018 06:00
Desde a falência do banco Lehman Brothers, nos Estados Unidos (EUA) ; que antecedeu a crise econômica mundial de 2008 ;, o endividamento das empresas e das famílias no Brasil teve um crescimento rápido e em larga escala. O aniversário de uma década do anúncio dramático da quebra da instituição será no próximo sábado, e o país ainda sofre com os reflexos de políticas adotadas para superar a turbulência financeira. O saldo das dívidas adquiridas por operações de crédito disparou neste período, saindo de R$ 1,119 bilhão em agosto de 2008 para R$ 3,124 bilhões, pelos últimos dados do Banco Central, de julho. Na prática, a alta foi de 179%.

O endividamento das famílias e das empresas ou de 37,59% do Produto Interno Bruto (PIB) para 46,41%, segundo a autoridade monetária, o que representa uma expansão de mais de oito pontos percentuais. Os economistas afirmam que a maior demanda por empréstimos não é ruim, mas que, o que ocorreu foi um crescimento artificial, resultado de políticas de incentivos desenfreadas de o ao crédito. Política que teve consequências maléficas, pois resultou na crise fiscal de 2014, que perdura até hoje.

A quebra do Lehman Brothers ocorreu pela grande facilidade de o ao crédito, expondo o sistema financeiro dos Estados Unidos a grandes riscos. O banco era considerado um dos maiores operadores de empréstimos de Wall Street, atuando em financiamentos imobiliários voltados a pessoas com alto risco de inadimplência. Extraoficialmente, os problemas financeiros da instituição eram contabilizados desde 2007, mas a falência só veio no ano seguinte. A baixa contábil do banco foi o gatilho para que a ;bolha imobiliária; de empréstimos, como ficou conhecida, estourasse, afetando quase todas as economias do mundo.

Entusiasmo

Os bancos centrais de diversas nações foram obrigados a reduzir as taxas de juros, e os governos, a adotarem medidas de injeção de recursos na economia. O Brasil foi um desses países. O ex-diretor do Banco Central, Carlos Eduardo de Freitas, explica, porém, que o país tinha um cenário econômico favorável. Havia quitado a dívida com o Fundo Monetário Internacional (FMI) e entrado no hall de nações com grau de investimento, ou seja, atrativo para aplicações financeiras. Além disso, o bom momento das commodities e da economia chinesa permitiu desempenho animador das exportações brasileiras.

;O Brasil conseguiu, de fato, não ter um impacto tão forte em 2008 com a crise global. As políticas de incentivo ao crédito, de certa forma, ajudaram o país a criar um escudo quanto à onda de crise que vinha afetando todos os outros país, e a China foi fundamental para isso;, explicou Freitas. ;Mas o governo brasileiro se entusiasmou com as ações de incentivo ao crédito e à concessão de subsídios, que, na verdade, deveriam ter sido interrompidos em 2010. O que não ocorreu;, completou.

Depois disso, o Banco Central reduziu a taxa Selic, chegando até 7,25% ao ano em 2013. As facilidades de o aos financiamentos foram ampliadas e os créditos direcionados se ampliaram. Isso resultou, além no grande endividamento das empresas e das famílias, em alta da inflação, que chegou aos 10,67% em 2015, um ano depois da mais recente crise econômica.

Marolinha

Desde agosto de 2008, o saldo de créditos direcionados ; empréstimos com taxas subsidiadas ; saltou de R$ 353 milhões para R$ 1,485 bilhão. O maior nível ocorreu em janeiro de 2016, quando alcançou R$ 1,583 bilhão. Levando em consideração a última década, esse tipo de financiamento saiu de 11,87% do PIB para 22,06%.

O economista Silvio Campos Neto, analista da Tendências Consultoria, afirmou que o aumento do o ao crédito não é negativo, mas é preciso ser feito de forma não ;artificial;. ;Estímulos excessivos a financiamentos com crédito diferenciados com condições não desejáveis para as contas públicas construiu um lado ruim da história. Em 2014, antes da crise econômica, a população chegou endividada. O governo federal forçou a mão usando essas linhas de subsídios, que também é um dos fatores do atual desequilíbrio das contas públicas;, disse.

Em 2008, a crise internacional era apelidada no exterior como tsunami, mas o ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva afirmou que chegaria no Brasil como uma ;marolinha;. Na época, as medidas foram adotadas de forma justificada: para segurar a turbulência que caminhava em direção ao Brasil. Nos anos seguintes, porém, durante o governo Dilma Rousseff, a política de estímulos foi mantida, num contexto diferente, e levou o país à pior recessão da história.

Crescimento menor do PIB

Após o Brasil ter registrado deflação em agosto, os economistas do mercado financeiro aram a prever alta menor de preços este ano. O Boletim Focus, que traz uma compilação das projeções econômicas do mercado, reduziu a expectativa para inflação deste ano de 4,16% para 4,05%. Para 2019, o Índice de Preços ao Consumidor Amplo (IPCA) seguiu em 4,11%. Já a projeção de alta para o Produto Interno Bruto (PIB) este ano recuou de 1,44% para 1,40%. Para o ano que vem, permaneceu o crescimento de 2,5%. A combinação entre inflação baixa e crescimento lento fez os economistas manterem a expectativa de que a Selic (taxa básica de juros) fechará 2018 no atual patamar, de 6,5% ao ano. Para 2019, em função do crescimento um pouco maior, a projeção é de que a Selic encerre o ano aos 8%.

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